“A abordagem neuropsicológica deveria ser obrigatória em todos os doentes com síndrome coronária aguda, como enfartes do miocárdio, de modo a identificar défices cognitivos e a implementar programas de reabilitação neuropsicológica tendentes a reduzir o impacto da doença na cognição.” A conclusão é de um estudo português coordenado por Bruno Peixoto, investigador do CINTESIS e docente da CESPU, com o objetivo de calcular a prevalência de défices neurocognitivos num grupo de doentes a fazer reabilitação cardíaca num hospital após uma síndrome coronária aguda. Esta é uma das patologias cardiovasculares mais prevalentes e com maior mortalidade, nela se incluindo o enfarte agudo do miocárdio.

Outro dos objetivos deste estudo era estabelecer a relação entre o funcionamento cognitivo após a doença e uma série de variáveis sociodemográficas (idade, escolaridade e profissão), clínicas (pressão arterial) e emocionais (como a ansiedade).

Neste trabalho, recentemente publicado no Journal of Cardiovascular and Thoracic Research, conclui-se que a percentagem de disfunção cognitiva após uma síndrome coronária aguda é “consideravelmente elevada”.

Os dados indicam que 85% dos doentes têm algum grau de compromisso cognitivo, uma prevalência bastante superior à registada noutros estudos do género (entre 10,51 e 66,8%). Destes, cerca de metade (49,1%) tem défices considerados graves.

As áreas mais afetadas pela síndrome cardíaca aguda são a fluência verbal e a memória. Nesta população, 84,8% dos doentes têm algum compromisso da fluência verbal, sendo que este compromisso é grave em cerca de 50% dos casos. Além disso, 60,3% apresentam défices de memória. Apenas 26% têm a linguagem comprometida.

A idade é um dos fatores mais relacionados com o surgimento de défices neurocognitivos após uma síndrome coronária. O mesmo é dizer que quanto mais idade tiver o doente, maior a probabilidade de sofrer algum tipo de défice.

Quanto ao défice de memória, aparece claramente relacionado com o tabagismo. Existe mesmo uma relação entre o número de cigarros fumados diariamente antes do evento coronário e a gravidade com que a memória é afetada.

Já a fluência verbal está associada, neste estudo, com a escolaridade, “um fator conhecido de reserva cognitiva”. Confirma-se, assim, que uma maior escolaridade protege os doentes que sofreram um evento coronário da afetação neurocognitiva.

Embora atinjam uma percentagem inferior de doentes, os problemas de linguagem subsequentes a uma síndrome coronária aguda surgem relacionados com fatores como a pressão arterial diastólica e a profissão, sendo que as profissões ditas intelectuais são as menos afetadas.

No que se refere a fatores emocionais, os doentes com mais ansiedade são também aqueles com menos comportamentos saudáveis e, logo, com mais fatores de risco cardiovascular.

Face à elevada prevalência de problemas cognitivos nestes doentes, Bruno Peixoto considera que deveria ser realizada por sistema uma avaliação neurocognitiva para detetar possíveis défices e iniciar o mais rapidamente possível um programa de reabilitação, diminuindo, assim, o impacto destas doenças na população.