Um estudo promovido por investigadores do CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde concluiu que a maioria (67%) dos familiares de idosos que apresentaram estado confusional agudo durante o internamento hospitalar sofre níveis de desgaste psicológico graves, comprometendo a sua saúde mental. O trabalho foi publicado na revista científica Aging & Mental Health.
Afetando cerca de metade dos idosos internados, “a síndrome confusional aguda é um problema neuropsiquiátrico grave e frequente, caraterizada por uma alteração na atenção, consciência e cognição (por exemplo, com desorientação, défice de memória, de linguagem, de capacidade visuoespacial ou alteração da perceção), com curso flutuante e causa orgânica subjacente”, explicam os autores. Assim, esta síndrome, muitas vezes não reconhecida, está associada a um maior período de permanência no hospital, institucionalização precoce, demência e maior risco de morte.
Quando passam por uma experiência traumática, como uma queda, que desencadeia recurso ao serviço de urgência e internamento subsequente, muitos idosos desenvolvem esta síndrome. Os pacientes que recordam estes episódios falam de uma “experiência extremamente angustiante, em que a realidade e a irrealidade se misturam, surgindo pensamentos nebulosos, falta de controlo, medo, ansiedade, sentimentos de ameaça, alucinações e incapacidade em comunicar com os familiares e profissionais de saúde”, contextualiza Sónia Martins, primeira autora deste trabalho e investigadora no CINTESIS.
Lia Fernandes, responsável pelo estudo e investigadora na área do Envelhecimento e Saúde Mental do CINTESIS, explica que “foi com o objetivo de estudar o impacto deste problema, tão recorrente nos idosos, com repercussões nos seus familiares e profissionais de saúde que uma equipa multidisciplinar, envolvendo médicos, enfermeiros, psicólogos e investigadores, do CINTESIS e da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto se juntou, já desde 2010, ao Serviço de Medicina Intensiva do Centro Hospitalar de S. João (CHSJ), sob a coordenação de José Artur Paiva.
Os investigadores implementaram o estudo em duas Unidades de Cuidados Intermédios do CHSJ, entre setembro e dezembro de 2016. Foram avaliados 42 pacientes, sendo que 28,6% desenvolveram síndrome confusional aguda. Dos 42 pacientes, 32 membros da família estavam presentes no momento de internamento.
Na sua maioria, os membros da família recrutados eram as filhas, casadas com cerca de 50 anos de idade, sendo que 36% coabitavam com o idoso. Os profissionais de saúde incluídos no estudo correspondiam a 12 enfermeiras, com uma média de idade de 33 anos, exercendo maioritariamente há mais de 10 anos.
Numa escala de 0 a 4, em média, os níveis de desgaste psicológico dos familiares destes idosos era de 3, sendo que 67% reportaram níveis graves de sofrimento psicológico. Entre os enfermeiros, a taxa situou-se nos 42%. “Ver um ente querido sob o efeito desta síndrome é uma experiência marcante também para os seus familiares e isso deve ser reconhecido e minimizado. O nível de sofrimento psicológico reportado por esses familiares é assinalável e merece ser reconhecido e combatido”, salienta Lia Fernandes, que é também médica psiquiatra no CHSJ.
Os enfermeiros são especialmente afetados quando estes pacientes ficam muito agitados, interferindo com os cuidados que lhe são prestados e com a sua própria segurança. Os autores defendem assim, a necessidade de ser desenvolvida uma abordagem sistémica para a gestão desta síndrome confusional aguda durante o internamento, focada não só nos doentes, mas também nas necessidades dos familiares e dos enfermeiros.
“Os familiares podem beneficiar de intervenções de suporte e programas psico-educacionais. O corpo de enfermagem necessita de apoio e de treino especializado, sobretudo quando lidam com a agitação psicomotora dos idosos”, sumariza Lia Fernandes, antecipando a necessidade de seguimento destes doentes que sofreram de síndrome confusional aguda, bem como dos seus familiares e cuidadores.
Financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), o estudo contou ainda com a colaboração de Elika Pinho, Raquel Correia, Emília Moreira, Luís Lopes e Luís Azevedo.