A maioria dos portugueses tem perceções erradas sobre os seus próprios comportamentos e estilos de vida, nomeadamente no que respeita à sua alimentação, à atividade física e ao consumo de álcool, considerando que estes são mais saudáveis do que realmente são.
De acordo com um estudo da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) e do CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde, publicado no International Journal of Environmental Research and Publich Health, a maior parte dos portugueses tem opiniões informadas sobre comportamentos e estilos de vida, mas tende a sobrestimar as suas próprias atitudes nesta matéria.
“Os portugueses sabem que uma dieta saudável, atividade física regular e um sono de boa qualidade podem prevenir algumas doenças e que o consumo de tabaco e drogas ilícitas, o tempo excessivo de atividades de ecrã, o stress excessivo e ser sedentário podem causar ou agravar algumas doenças. O que falha é a forma como cada pessoa perceciona o seu próprio estilo de vida, ou seja, o seu autodiagnóstico”, explica Rosália Páscoa (FMUP/CINTESIS), autora principal deste trabalho.
A equipa avaliou as perspetivas de portugueses com idade igual ou superior a 20 anos relativamente aos seus estilos de vida e à abordagem dos médicos de família. Foi analisada uma amostra representativa da população portuguesa, através de questionários presenciais realizados entre janeiro e abril de 2019. Os participantes tinham entre 23 e 85 anos de idade e 55% eram mulheres.
O estudo “Patients’ Perspectives about Lifestyle Behaviors and Health in the Context of Family Medicine: A Cross-Sectional Study in Portugal” indica uma discrepância significativa entre o autodiagnóstico e a prática, a começar pela alimentação. Embora 87% das pessoas considerem que têm hábitos alimentares saudáveis, apenas 14% “passam no teste”. Isto significa que 61,7% dos portugueses não se alimentam de forma saudável, mas estão convencidos do contrário.
Muitos portugueses estão também enganados em relação ao próprio peso. Apenas 2,1% dizem ser obesos, quando, na verdade, 13,4% cumprem os critérios de obesidade definidos, e só 15,6% acham que têm excesso de peso, quando essa percentagem se situa nos 40,2%.
As disparidades entre a autoavaliação e a realidade repetem-se em matéria de atividade física: 48,8% dos portugueses dizem que praticam atividade física regularmente, mas, se seguirmos as recomendações, tal só acontece em 28,9% dos casos.
Por outro lado, 92,2% dos portugueses pensam que não têm um consumo excessivo de álcool, mas os resultados do estudo mostram que 27,9% consomem álcool em excesso.
Os investigadores concluíram ainda que a maioria dos portugueses considera importante a ajuda dos médicos de família na adoção de comportamentos e estilos de vida mais saudáveis. No entanto, a percentagem de pessoas que diz ter esse apoio, na prática, é significativamente mais baixa.
“O aconselhamento de estilos de vida consome tempo na consulta dos médicos de família e tornou-se mais difícil no contexto da pandemia de COVID-19. Seria da maior importância que os decisores políticos pudessem criar condições para tornar exequíveis e prioritárias estas intervenções”, consideram.
Os autores do estudo entendem ainda que é essencial formar os médicos, nomeadamente na Medicina Geral e Familiar, para que possam atuar, cada vez mais, como promotores e facilitadores de alterações nos estilos de vida.
Além de Rosália Páscoa (FMUP/CINTESIS), participaram neste estudo Micaela Gregório, da FMUP, Rosa Carvalho (#H4A Primary HealthCare Research Network), Andreia Teixeira e Carlos Martins (FMUP/CINTESIS).