As crianças e os idosos são as vítimas dos acidentes de viação em Portugal que envolvem “maiores complexidades e desafios no diagnóstico, tratamento, reintegração e abordagem forense”, refere um estudo desenvolvido por investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) e do CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde.
“As diferenças entre os grupos etários e o impacto dos casos mais severos justificam estudos médico-legais mais detalhados nas crianças, nas pessoas mais velhas e em vítimas com traumatismo grave”, entendem os autores do artigo científico publicado na “Forensic Sciences Research”. Não foram encontradas diferenças entre os sexos neste estudo, apesar de outros estudos já a terem identificado.
De facto, embora os adultos em idade ativa (18 e 64 anos de idade) constituam a maior parte das vítimas registadas (65%), as crianças (8% abaixo dos 18 anos) e sobretudo as pessoas com mais de 64 anos (27%) apresentam um “score” de gravidade das lesões (ISS) significativamente superior ao dos adultos em idade ativa.
Os membros inferiores e superiores são as zonas do corpo mais atingidas nos acidentes, seguindo-se a cabeça e o pescoço, e as sequelas musculoesqueléticas são a maioria (64,8%), tendo como consequência limitações nas atividades da vida diária (51,7%), na vida social e afetiva, nas atividades de desporto ou lazer (40,5%) e no trabalho (36,4%).
Quando são contabilizados os dias perdidos, percebe-se que os danos, mesmo quando temporários, resultam em 199,6 dias (mais de meio ano) de incapacidade para a vida diária, em média. As vítimas só puderam regressar ao trabalho, em média, ao fim de 171,7 dias.
Do total, 19% das vítimas ficaram permanentemente dependentes, sendo que 10,6% passaram a necessitar de assistência de uma terceira pessoa.
Este estudo, que envolveu 667 vítimas não fatais de acidentes rodoviários, entre os 3 e os 94 anos de idade, analisou os traumas sofridos com base em relatórios médico-legais, utilizados para aferir o dano pessoal, de acordo com a metodologia tridimensional de avaliação deste dano. Esta metodologia considera a vítima numa perspetiva biopsicossocial e ecológica, analisando-a na sua vida real/concreta e permitindo uma intervenção e uma reparação do dano pessoal mais efetiva.
Os investigadores concluíram que “os acidentes ocorridos nas estradas portuguesas se acompanham, muitas vezes, de importantes consequências, mesmo a longo prazo, e que os extremos etários podem envolver maior gravidade não só em termos de saúde física, mas também de reintegração, em virtude da especial vulnerabilidade das vítimas associada, entre outros, a aspetos fisiológicos específicos destas fases etárias”.
Os sobreviventes de acidentes de viação experimentam sequelas a curto e longo prazo, muitas vezes com incapacidade e custos económicos consideráveis que têm um grande impacto na sua qualidade de vida e na das suas famílias.
A nível global, os acidentes de viação são um problema de saúde, social e económico, estimando-se que vitimem 50 milhões de pessoas por ano.
Este estudo teve como autores Flávia Cunha-Dinis, Tiago Taveira-Gomes e Teresa Magalhães, do CINTESIS-Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, tendo contado também com José Manuel Teixeira, dos Serviços Clínicos da Companhia de Seguros Fidelidade, S.A.