Cerca de três centenas de médicos de família e internos de Medicina Geral e Familiar provenientes de 21 países, sobretudo europeus, participaram no II European Forum on Prevention and Primary Care, que decorreu entre os dias 5 e 6 de novembro, no Porto, em parceria com o CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde.
Carlos Martins, investigador do CINTESIS e atual presidente da EUROPREV – European Network for Prevention and Health Promotion in Family Medicine and General Practice, foi o mentor da iniciativa, que contou com a presença de Altamiro da Costa Pereira, coordenador do CINTESIS e diretor eleito da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, de Jorge Brandão, em representação da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, e de Mehmet Ungan, da WONCA EUROPE, entre outras personalidades.
“Medical Prevention: the balance of benefits and harms” foi o tema central desta segunda edição. Em causa está a relação entre a evidência científica atual e as atividades de prevenção no contexto da Medicina Geral e Familiar.
“Muitas vezes, a evidência científica aponta em direções opostas ao senso comum e até à prática clínica. Este foi um tema muito debatido no Fórum. Falamos, por exemplo, de atividades de rastreio, quer oncológicos, quer análises ao colesterol ou medição da tensão arterial. Hoje sabemos que muitas atividades preventivas podem trazer benefício, mas também podem implicar algum dano para os doentes”, explica Carlos Martins.
Uma das grandes questões é como comunicar este potencial dano associado a certas atividades preventivas. “Tradicionalmente, ao longo das últimas décadas, o que a comunidade médica tem transmitido é apenas o lado positivo da prevenção. À luz da ciência e dos dados de que dispomos, chegámos à conclusão que é preciso transmitir também os potenciais danos. Além da componente dos custos de intervenções, as pessoas correm o risco de ser desnecessariamente diagnosticadas com doenças que nunca lhes causariam problemas”, continua.
De acordo com o investigador principal do grupo H4A – Health for All, do CINTESIS, “temos atualmente sistemas de avaliação das equipas de cuidados de saúde primários em que são usados como indicadores de desempenho, por exemplo, os rastreios realizados, que medem apenas a percentagem de pessoas que, num determinado grupo etário, realizaram o rastreio. Este tipo de indicadores pressiona a favor da realização do rastreio porque as equipas são avaliadas por isso”.
Para o especialista, seria desejável que este tipo de indicadores fosse alterado, “no sentido de medir se foi fornecida informação imparcial e isenta sobre os potenciais benefícios e riscos do rastreio para que a pessoa possa decidir se quer ou não fazer. Pode optar por não fazer e essa é uma escolha legítima”.
A propósito, Carlos Martins diz que o EUROPREV poderá vir a apresentar oficialmente um “statement” para “incentivar as autoridades de saúde dos diferentes países europeus a deixarem de usar este tipo de indicadores que pressionam no sentido do rastreio e a usarem indicadores que fomentem uma informação correta, transmitindo a verdade sobre os rastreios, quer os lados positivos, quer os negativos”.
Como tal, considera que será cada vez mais importante o ensino das técnicas de comunicação clínica com os pacientes, desde a formação médica pré-graduada, para que haja um fortalecimento da relação médico-doente baseado em dados científicos. “Essa comunicação é fundamental porque é a translação da linguagem científica para uma linguagem percetível pelo cidadão comum”.
A terceira edição do European Forum on Prevention and Primary Care está já agendada para os dias 4 e 5 de novembro de 2019, no Porto, e será, uma vez mais, sobre prevenção no contexto dos Cuidados de Saúde Primários.