Um grupo de investigadores do CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde marcou presença num debate organizado no dia 7 de julho pelo Laboratório Associado RISE – Rede de Investigação em Saúde, em colaboração com o Laboratório Associado de Translação e Inovação para a Saúde Global – REAL, sobre Importância da Investigação Clínica no contexto do desenvolvimento científico.

Integrado no programa do Encontro Ciência 2023, como sessão temática, este debate reuniu um conjunto de investigadores com experiência na área da investigação clínica, de diferentes instituições, para além de ter contado com a presença de representantes da Agência de Investigação Clínica e Inovação Biomédica (AICIB) entre a audiência.

A sessão abriu com a intervenção de Fernando Schmitt, investigador do CINTESIS e coordenador do Laboratório Associado RISE, que destacou a relevância destes dois Laboratórios Associados, em particular – RISE e REAL, no âmbito da promoção da investigação clínica em Portugal.

Subfinanciamento crónico

João Pedro Ferreira, investigador da UNIC@RISE, foi o primeiro palestrante ouvido após a sessão de abertura. Recordando um artigo recentemente publicado na Acta Médica Portuguesa, subscrito por diversos investigadores do CINTESIS@RISE, o investigador defendeu que Portugal tem um problema crónico de subfinanciamento no que à investigação clínica diz respeito. “A Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) financia projetos de investigação em todas as áreas com um valor máximo de 250 mil euros (…), mas não existe nenhuma call especificamente destinada à investigação clínica”.

João Pedro Ferreira abordou ainda as dificuldades sentidas na execução de ensaios clínicos da iniciativa do investigador, defendendo que estes ensaios devem receber apoio, “porque são a única forma de gerar evidência de forma independente e com aplicação rápida na prática clínica”. “A indústria só financia estudos que tenham algum interesse do ponto de vista do mercado. E, portanto, a única forma de realizar investigação clínica independente seria através de financiamento público”, destacou.

Para isso, o investigador sugere a adoção de um “modelo de financiamento integrado, com um concurso anual dedicado à investigação clínica, fomentando projetos multicêntricos que promovam a colaboração entre hospitais, centros de saúde e universidades”.

Dados suportam tomada de decisão baseada em evidência

Também Luís Azevedo, investigador do CINTESIS@RISE, foi ouvido nesta sessão. Numa intervenção sobre o papel da Ciência de Dados na investigação clínica, o especialista salientou que a Ciência de Dados na Saúde “tem como objetivo utilizar os dados para suportar a tomada de decisão e o planeamento estratégico na área da saúde”. “Os dados, para nós, são meramente instrumentais. Servem para atingir objetivos no âmbito da investigação clínica, respondendo a questões fundamentais da medicina clínica, e apoiar os processos de tomada de decisão em vários níveis”, desde a decisão clínica, passando pelas decisões nas instituições de saúde, até à decisão nas políticas de saúde – “todas elas devem ser apoiadas com a melhor evidência científica disponível”.

No entanto, o especialista lembra que a Ciência de Dados enfrenta alguns desafios. “Os dados na área da saúde são heterogéneos, em grande quantidade, difíceis de perceber, contextuais e podem levantar dificuldades enormes”. Há, no entanto, sinergias que podem ser criadas: “a Ciência de Dados está a olhar para a utilização dos dados do mundo real e para a geração da evidência do mundo real. Há enormes quantidades de dados a serem produzidas todos os dias. A Ciência de Dados em Saúde tem como um dos seus objetivos desenvolver métodos que permitam fazer a melhor utilização possível desses dados do mundo real que, sendo observacionais e retrospetivos, complementam outros tipos de estudos”.

Luís Azevedo terminou deixando a nota de que a Ciência de Dados é “fundamental no cumprimento da missão da investigação clínica” que, sendo centrada no indivíduo, tem como objetivo “prestar os melhores cuidados de saúde possíveis”.

Promessas de soluções em debate

Em resposta às preocupações manifestadas em matéria de apoio e financiamento, Catarina Resende de Oliveira, presidente da AICIB, comentou que “não existe uma estratégia que permita alocar os fundos adequados aos alvos de investigação para que ela se realize”. Informou ainda que a tutela, através dos Ministérios da Economia, da Ciência e da Saúde, está a promover grupos de trabalhos que procuram respostas para alguns dos desafios identificados, “nomeadamente na área dos Dados”. E acrescentou haver também “falta de financiamento para as Agências que poderiam ter um papel importante [na promoção da investigação clínica] e que foram criadas para esse fim”.

Fernando Schmitt, assumindo a moderação do debate final, salientou que existe, entre os investigadores, o reconhecimento de “que a investigação clínica tem o seu papel, a sua importância, a sua peculiaridade”. Havendo já uma agência criada para a promoção deste tipo de investigação, é preciso “financiamento para a agência, bem como avaliadores diferenciados neste tipo de investigação”.

Luís Azevedo terminou, afirmando que a investigação clínica pode ter um impacto económico importante. “A capacidade de a investigação clínica fazer captação de financiamento é enorme. Podia ser um negócio relevante para os hospitais e para o SNS”. “Podemos poupar dinheiro e podemos ganhar dinheiro com a investigação clínica. É um contrassenso enorme continuarmos a falar connosco próprios sobre isto”, concluiu.

Na sessão intervieram ainda Lúcia Domingues, Inês Fronteira e Marcelo Urbano Ferreira, do Laboratório Associado REAL, trazendo para a discussão a importância dos Centros Académicos Clínicos, o impacto da investigação clínica nas comunidades e a necessidade do seu envolvimento, e a saúde de precisão, respetivamente. Também Carla Bartosh, do CI-IPOP@RISE, apresentou a Patologia como instrumento na investigação clínica durante a sessão temática.

O Encontro Ciência 2023 decorreu entre os dias 5 e 7 de julho, na Universidade de Aveiro. É uma iniciativa da responsabilidade da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), em colaboração com a Ciência Viva –  Agência Nacional para a Cultura Científica e Tecnológica , com o apoio institucional do Governo, através do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e da Comissão de Educação e Ciência da Assembleia da República.