A exposição a poluentes agrava o risco cardiovascular em doentes que já têm outros fatores de risco, mesmo quando já estão em tratamento, indica um estudo desenvolvido por investigadores do CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde e publicado no Archives of Environmental and Occupational Health.
O estudo analisou a influência dos poluentes orgânicos persistentes (POPs), como o pesticida DDE, no perfil cardiometabólico e inflamatório de uma população de mulheres pré-menopausa, obesas e hipertensas.
“Temos assistido ao interesse crescente da sociedade para os efeitos da exposição a poluentes. Apesar de o uso de muitos POPs ter sido banido, a sua presença no ambiente e nas populações continua a ser uma realidade, muito devido às características de persistência e de bioacumulação deste grupo de poluentes. É impossível escapar completamente à exposição, pelo que o foco de atuação deverá passar pela prevenção, monitorização e pesquisa de efeitos na saúde”, explicam os autores.
Neste estudo, os cientistas recolheram amostras de sangue, de tecido adiposo visceral e de tecido adiposo subcutâneo de um total de 43 mulheres no momento da cirurgia bariátrica. Estas foram depois comparadas com um grupo de mulheres obesas, mas que não eram hipertensas.
De acordo com esta investigação, as concentrações de poluentes eram significativamente mais elevadas nas mulheres obesas e hipertensas do que nas mulheres obesas, mas sem hipertensão. Nas mulheres com obesidade e hipertensão, o risco cardiovascular estava sempre aumentado, independentemente da existência de tratamento.
Estes dados sugerem que a acumulação de poluentes no tecido adiposo visceral e no sangue implica um risco aumentado de sofrer um evento cardiovascular, como um enfarte do miocárdio, doença coronária, insuficiência cardíaca ou acidente vascular cerebral, mesmo quando se toma medicação para baixar a pressão arterial.
Em consequência, “a análise da concentração de poluentes no tecido adiposo visceral poderá ser útil para detetar os doentes em maior risco e para antecipar o tratamento farmacológico”.
Sob coordenação de Conceição Calhau, docente na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, este estudo tem como coautores vários investigadores do CINTESIS, nomeadamente Ana Ferro, Diana Teixeira, Diogo Pestana, Cristina Santos e Jorge Polónia.
Anteriormente, os investigadores desta Unidade já haviam realizado outros estudos, quer em humanos, quer no modelo animal, tendo concluído que a presença de poluentes no organismo está relacionada com maior risco de desenvolver doenças como a obesidade, a diabetes e a hipertensão.
Os poluentes orgânicos persistentes são substâncias derivadas sobretudo de atividades industriais, podendo contaminar o ar, o solo e água. São ou foram usados como pesticidas, ingredientes de produtos industriais, domésticos e de cuidado pessoal e plastificantes, por exemplo. No ser humano, a exposição a estes contaminantes ocorre sobretudo através da alimentação, mas também através da inalação ou exposição dérmica, existindo uma acumulação preferencial no tecido adiposo. É conhecido o seu efeito enquanto disruptores endócrinos.
De acordo com os investigadores, “as entidades competentes, nomeadamente a EFSA, procuram definir doses seguras nos alimentos e de exposição, porém nem sempre é possível abranger a complexidade da exposição crónica a estes contaminantes, nem a misturas. Dessa forma, é necessário apostar na biomonitorização e diminuição destes poluentes nas fontes de exposição, nomeadamente alimentos como as carnes vermelhas, os lacticínios e os peixes gordos, por exemplo”.
Pela sua parte, a equipa promete “continuar a explorar os mecanismos responsáveis pelos efeitos destes poluentes no metabolismo, nomeadamente na hipertensão e risco cardiovascular”. No futuro, será ainda necessário “desenvolver estratégias que impeçam ou atenuem este processo deletério que conduz aos eventos e à morte”.